Contexto

Em 18 de outubro de 1994 agentes da Polícia Civil do Rio de Janeiro invadiram várias casas localizadas na favela de Nova Brasília que integra o conjunto de favelas conhecido como Complexo do Alemão — sob o pretexto de cumprir um mandado de prisão. Durante a operação, os policiais executaram 13 pessoas e praticaram atos de tortura e violência sexual contra três jovens, duas delas menores de idade. Os policiais alegaram que as vítimas que foram mortas resistiram à prisão, de modo que que nenhuma investigação a respeito dos fatos que resultaram nas mortes durante a incursão policial foi realizada .

Em 8 de maio de 1995, o Departamento de Repressão a Roubos e Furtos contra Estabelecimentos Financeiros, órgão da Polícia Civil, realizou uma nova operação na favela de Nova Brasília, com o objetivo de deter pessoas supostamente envolvidas no tráfico de armas. A polícia usou armas de fogo, disparando até mesmo de dois helicópteros sobrevoando a favela, causando mortes e pânico na população local. Segundo depoimentos de vizinhos da casa em que encontraram os jovens, apesar de terem se rendido e implorado para que não os matassem, pelo menos 8 das 13 vítimas foram executadas, dentro de casa ou quando se renderam com as mãos para cima.

As duas intervenções policiais resultaram em 26 pessoas executadas e três vítimas de tortura e violência sexual perpetrada por policiais civis e militares. Nas duas chacinas, os corpos foram retirados do cenário dos acontecimentos, o que inviabilizou a adequada perícia para identificar o contexto em que as mortes ocorreram. O levantamento balístico também não foi realizado naquela época. Apesar de várias evidências que indicavam um contexto de execução sumária, a narrativa construída pelas autoridades de segurança, que incluía agentes que estiveram envolvidos nos eventos, e que terminaram por ser responsáveis por conduzir as investigações, afirmava que nas duas chacinas houve confrontos entre as vítimas e os policiais, o que teria justificado a violência por parte da polícia.

Em julho de 1996, o CEJIL e o ISER denunciaram os fatos à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A CIDH emitiu em 2011 recomendações a serem cumpridas pelo Estado brasileiro e, em razão do descumprimento por parte do Estado a essas recomendações, remeteu o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2015. Após nova apresentação de declarações e documentos pelas organizações representantes das vítimas e da contestação por parte do Estado brasileiro, a Corte determinou a realização de uma Audiência Pública sobre o caso em 12 e 13 de outubro de 2016 durante o 56º Período Extraordinário de Sessões da Corte Interamericana de Direitos Humanos em Quito, Equador.

Lamentavelmente, o caso de Nova Brasília não é um incidente isolado, mas um reflexo da realidade recorrente da violência policial.Na década de 1990, entre janeiro de 1993 e julho de 1996, foram 1.194 pessoas afetadas, entre mortos e feridos por armas de fogo, pela ação policial no Estado do Rio de Janeiro. Já entre os anos 2003 e 2014, 10.634 foram os homicídios resultantes da ação policial no Estado.